Museus do que não se descobre
É atribuída a Alexandre o Grande, grego macedónio que liderou conquistas e um Império considerável, não maior porque a morte o colheu cedo, a seguinte frase: “ expansão sem defesa é inútil.”
Como todos os poderosos, também Alexandre o Grande teve, depois de morto, elogios exagerados e críticas anormais.
Herói para uns, monstro para outros, Alexandre é afinal o que a história regista sempre no discurso dos sucessores, porque foram deserdados ou porque receberam o que mais lhe convinha.
Essa história, escrita pelos sucessores, não é a história que hoje alguns querem ver escrita.
Não há Alexandre o Grande sem Seleuco nem Antípatro (Seleuco criaria uma dinastia de três séculos, na sequência da morte de Alexandre e governava um território tão grande, do rio Tigre ao rio Indo, que mais parecia um imperador e Antípatro, ainda em 320 a.C. tornou-se o regente de todo o império de Alexandre, que morreu em 323 a.C.). Mas também não há a compreensão de quem foi Alexandre sem o estudo dos persas, dos egípcios, dos indianos, dos chineses – de todos os povos, nucleares ou de grande expressão, que ele afetou de alguma forma no seu tempo.
Muitos dos relatos próximos da época são meros entusiasmos. Alguns relatos mais tardios são mitos extraordinários. Seria Alexandre o líder que respeitou os povos conquistados sem lhes pedir quase nada em troca ou o guerreiro sanguinário, bêbado as mais das vezes, que se cobrira de riquezas mas também de sangue e miséria alheios?
Há quem lhe atribua outra frase: “Se queremos não apenas passar pela Ásia mas mantê-la, temos de mostrar clemência a estes povos; é a sua lealdade que fará com que o nosso império seja estável e permanente.”
Sabemos que nem estas frases, atribuídas ao protagonista, fazem história, mas ajudam no entanto a alimentá-la no que exigem de imaginário e avidez à narrativa.
Tudo isto foi o que, por alto, pensei ao ver recentemente um debate televisivo sobre um hipotético Museu da Descoberta que a Câmara Municipal de Lisboa quer apadrinhar.
No painel desse debate, gente que respeito e outra de um extremismo repetitivo e de argumentos pouco sãos, a coabitarem nas suas quase razões. Na moderação: pouca pedalada para o conteúdo da matéria.
A nossa história está longe de estar escrita. Teve mesmo um período de analfabetismo funcional, ao escrever-se titubeante debaixo de uma ditadura que deformava a história. Inventem-se novos historiadores, libertem-se as potencialidades dos novos investigadores. A haver uma descoberta que seja a de nós mesmos.
Queremos a renovação do que somos, com um novo tipo de expansão. Que sem defesas…é inútil.
Alexandre Honrado
Historiador